Delação premiada, alegações finais e ampla defesa: o STF e sua “escolha de Sofia”*

Em artigo publicado no Diário Catarinense desta segunda-feira, o Dr. Aluísio Guedes Pinto aborda o difícil momento da Suprema Corte em relação à ordem de apresentação das alegações finais pelos réus delatores e delatados.

A expressão “escolha de Sofia” é oriunda do romance de mesmo nome, em que Sofia Zawistowk, sobrevivente do campo de concentração de Auschwitz, narra ter sido forçada por um soldado nazista a escolher um de seus dois filhos para ser morto; se não escolhesse, ambos seriam assassinados. A expressão representa, pois, uma situação na qual se deve optar entre duas alternativas, ambas igualmente insuportáveis.

O STF vê-se, hoje, diante de verdadeira escolha de Sofia quanto à questão dos réus delatados e de seu direito de falar por último no processo.

Em recente julgamento, a 2ª Turma do STF decidiu que, quando em um mesmo processo houver réus delatores e delatados, estes devem ser os últimos a apresentar alegações finais, uma vez que o delator, para assegurar os benefícios da delação premiada, deve demonstrar a participação dos corréus no ato delitivo; na verdade, o delator atua como uma espécie de assistente da acusação. Por isso, a Turma considerou nula sentença proferida na operação Lava Jato, uma vez que o magistrado não permitiu que os réus delatados apresentassem suas alegações finais posteriormente à manifestação dos delatores.

Conjecturou-se, a partir daí, que eventual extensão dessa decisão implicaria a anulação de toda a operação Lava Jato. De fato, a decisão provocou grande rebuliço no meio jurídico, sobretudo porque o Código de Processo Penal e a Lei das Organizações Criminosas nada dizem sobre a ordem de manifestação dos réus.

De todo modo, os princípios da ampla defesa e do contraditório pressupõem que a defesa sempre tenha a última palavra. O fato é que não há como garantir a ampla defesa senão assegurando ao réu o direito de manifestar-se após qualquer acusação.

Por isso, dentro da missão que lhe é outorgada, não pode o Supremo Tribunal Federal realizar qualquer modulação sobre a extensão da decisão a ser tomada com base no nome inscrito como réu na capa do processo que se julga e na operação investigativa de que se trata; deve a Corte, portanto, defender a ordem constitucional e os direitos e garantias fundamentais.

*Artigo publicado no Diário Catarinense do dia 14 de outubro de 2019.

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