Aspectos controversos da lavagem de dinheiro

A lavagem de dinheiro consiste, segundo a Lei n. 9.613/98, na ocultação ou dissimulação de valores provenientes de infração penal. Figurativamente, a lavagem de dinheiro é a conduta de “lavar” – tornar limpos – os recursos oriundos de delito antecedente. Com tal prática, o agente busca conferir um caráter lícito a recursos cuja origem é criminosa – e, portanto, ilícita.

Especialmente com as megaoperações investigativas, a lavagem de dinheiro tem assumido um papel central no sistema penal. Esse fenômeno, todavia, trouxe a reboque certos equívocos. O país vive um verdadeiro Direito Penal do Medo, em que todos são culpados até prova em contrário. Por isso, é importante desmistificar alguns aspectos atinentes à lavagem de dinheiro.

Não se pode negar que a lavagem de dinheiro é um crime grave, sobretudo porque geralmente está vinculada a outros crimes. Sabe-se, da mesma forma, que a lavagem de dinheiro é um delito complexo: suas nuances jurídico-dogmáticas são intrincadas e a sua compreensão exige um exame profundo.

Assim, é fundamental esclarecer que inexiste lavagem de dinheiro sem delito antecedente; ou seja, é necessária a prática de uma infração penal anterior, cujos proveitos serão, posteriormente, “lavados”. Essa constatação, embora soe banal, demonstra que a mera posse de dinheiro em espécie, por exemplo, ainda que em valores expressivos, não constitui crime.

Para a sua configuração, é necessário que o agente busque reinserir esses ativos na economia formal, conferindo-lhes aparência lícita, de forma que a mera aquisição de bens com valores provenientes de fatos, ainda que caracterizados ilícitos, não é suficiente para a configuração da lavagem.

Além de não ter um fim em si próprio, a configuração da lavagem de dinheiro exige que o agente tenha efetivo conhecimento quanto à ilicitude dos recursos “lavados”. Juridicamente, a lavagem de dinheiro somente é punível caso o agente atue com dolo. Esse é um importante limite na punição desta prática, na medida em que nem todos os recursos que transitam na economia formal têm sua origem identificada. O Fundo Monetário Internacional estima que de 3 a 7% dos recursos financeiros movimentados no mundo provêm de práticas criminosas.

Caso o efetivo conhecimento a respeito da ilicitude dos recursos não fosse necessário, isso implicaria a punição de uma infinidade de gestores das atividades econômicas públicas e privadas que, sem qualquer conhecimento ou intenção delituosa, manejam recursos provenientes de infrações penais.  Embora não constituam os únicos limites à punição da lavagem de dinheiro, a exigência da prática de infração penal antecedente, bem como o dolo e o conhecimento quanto à ilicitude dos recursos “lavados” são importantes requisitos. Conhecê-los é fundamental para que se desmistifique toda a aura existente em torno da lavagem de dinheiro, crime tão grave quanto incompreendido.

Por Aluísio Guedes Pinto, sócio do escritório Guedes Pinto Advogados Associados e especialista em Direito Comercial e Processo Penal

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